A crise sanitária mundial

Recentemente, tivemos a oportunidade de participar do Congresso Brasileiro de Direito Médico e da Saúde, organizado pela OAB Nacional em Brasília. Importante evento tanto para o setor de saúde quanto para do Judiciário, o debate apresentou significativo e respeitável material para a reflexão acerca dos desafios do direito à saúde em nosso País.

Com mais de mil participantes, o encontro elevou o nível do debate entre médicos, advogados e diferentes especialistas no campo de ética, políticas públicas, deveres dos profissionais e da sociedade, entre outros.

Um dos importantes debates foi colocado em pauta por Clenio Jair Schulze, Juiz Federal do TRF4, a respeito das implicações da prescrição médica fora da política pública de saúde. Nesse anseio – e para dar dimensão e corpo à sua explanação – o especialista apresentou dados da chamada “Crise Sanitária” em que não só o Brasil, mas diversos países desenvolvidos estão mergulhados. 

Em conjunto com as crises econômicas, políticas, climáticas e ecológicas, a crise sanitária preocupa diferentes nações e agrava a delicada questão sobre a qualidade de vida de milhões de pessoas em todo o mundo. Por mais que haja ampla literatura – fruto da latente preocupação sobre a questão – em países como a Itália, como apontou o Dr. Schulze, ainda falta maior reflexão do tema e seus impactos na sociedade brasileira. “A Era dos Direitos assentada por Norberto Bobbio tendencialmente acabou. Estamos na era dos não-direitos, tamanha a negação dos direitos fundamentais em saúde no mundo e, em especial, no Brasil”, preconizou. O debate, portanto, é indispensável para municiar os tomadores de decisão de ferramentas para combater de forma veemente a crise sanitária pela qual passamos. 

Dentro desse cenário de pior momento da crise sanitária em âmbito nacional e internacional, o Judiciário acaba por ser impactado diretamente com o crescente número de ações pleiteando diferentes direitos em saúde, como bem lembrou Dr. Schulze. “As promessas que foram e são negadas à sociedade acabam sendo levadas ao poder Judiciário, como guardião das diferentes promessas constitucionais”, assinalou. 

Os números demonstram claramente a questão. Afinal, 109,1 milhões de processos tramitaram pela Justiça durante 2016 segundo a edição 2017 do relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça. Dentre eles, cerca de 1,4 milhão são na área da saúde, ou seja, 1,5% de todos os processos em tramitação no judiciário no País.

De outro lado, há que se refletir também sobre uma possível crise no ensino médico no país. Exame aplicado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) para avaliação da classe médica que, historicamente, segundo o Dr. Schulze, tem menos da metade dos profissionais aprovados. Falta de estrutura das instituições, assédio da indústria, dilemas éticos, falta de comprometimento de vários profissionais e carreira pouco estruturada são apenas alguns dos fatores que dificultam a atuação de forma mais adequada e consolidadora do direito à saúde.

Como afirmamos aqui, não se trata, em hipótese alguma, de demonizar a classe médica e colocar o profissional sob suspeita. No entanto, é um tema premente dentro da agenda de mudanças e transparência exigidas para o avanço do setor. Já que as questões aqui colocadas têm impacto direto no acesso à saúde e nos critérios fundamentais do raciocínio médico que desaguam no Judiciário e na crise sanitária atual. Mas isso será tema de nosso próximo artigo. Acompanhe.

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