Infecção hospitalar não gera indenização automática

Uma das matérias que mais são frequentemente debatidas em ações que versam sobre erro médico-hospitalar diz respeito às chamadas IRAS, ou seja, as “Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde”. Isto porque existe uma ideia, equivocada, de que toda infecção hospitalar deve ser indenizável, já que a responsabilidade do hospital é objetiva.

Na direção contrária desta percepção, segundo o European Centre for Disease Prevention and Control, apenas cerca de 20% a 30% destas infecções são consideradas preveníveis, por meio de programas de controle e higiene intensivos.[1]

Mesmo a Lei nº 9.431/1997 e a Portaria MS 2.616/1998 (normativos que tratam da obrigatoriedade da manutenção de programa de controle de infecções hospitalares) são claras ao determinar que objetivo é reduzir, ao máximo, os índices de infecção hospitalar. Assim, não se pode exigir do Hospital a esterilização absoluta de seus ambientes, que é coisa impossível.

Essa discussão foi enfrentada, recentemente, pela 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. No caso concreto, a sentença julgou improcedentes os pedidos autorais para afastar a alegação de falha na prestação de serviços, em razão da infecção por bactéria de ambiente hospitalar.

É sabido que pacientes idosos, recém-nascidos, com comprometimento da imunidade ou com diabete mellitus mal controlada; com alteração da consciência (com maior risco de aspiração); com doenças vasculares (e dificuldade na oxigenação e cicatrização dos tecidos), acamados ou com necessidade de uso de dispositivos invasivos (sonda urinária, cateter venoso, ventilação por aparelhos, etc.) são mais suscetíveis a contrair infecção hospitalar, dada a imunidade baixa, independentemente dos esforços empreendidos pela entidade nosocomial, para evitar a referida afecção.

Acontece que, pela produção da prova pericial, no caso concreto, ficou demonstrado que o estado imunológico do paciente foi fator determinante para o surgimento da infecção.

De acordo com o relator, que lançou mão dos ensinamentos de Miguel Kfouri Neto,[2] apenas há que se falar em dever de indenizar, pelo hospital, quando demonstrado que: a) o paciente não portava nenhum agente infeccioso e nem baixa imunidade, antes da hospitalização; b) a infecção não é endógena; c) a infecção surgiu quando o paciente já se encontrava sob controle do hospital; d) a infecção foi causada por agente tipicamente hospitalar.

Demonstra-se, a partir deste interessante julgado, que a infecção hospitalar não gera responsabilização automática do hospital, na medida em que a infecção causada por um agente tipicamente hospitalar não se demonstra, por si só, suficiente para a demonstração do dever de indenizar.

[1]ECDC, European Centre for Disease prevention and Control. Healthcare-associated infections. 2016 apud ANVISA. Programa Nacional de Prevenção e Controle de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde. 2016. Disponível: https://bit.ly/3FAndAT

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