A Ministra Cármem Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), colocou na pauta de julgamento da Corte para o dia 7 de fevereiro se é ou não constitucional que a ANS cobre das Operadoras de Planos de Saúde (OPS) pelos beneficiários que são atendidos no SUS. A exigência do ressarcimento, descrita no artigo 32 da Lei nº 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde), é um dos temas mais polêmicos do setor e vem sendo questionada na Justiça desde 1998, por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) apresentada pela Confederação Nacional da Saúde (CNS).
Acontece que o artigo 32 da Lei 9.656/98 determina que “Serão ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, prestados a seus consumidores e respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema único de Saúde – SUS”. Ou seja, de acordo com a Lei em questão, a regularidade do ressarcimento é clara e inequívoca.
Para entender o porquê, basta uma rápida olhada na Constituição. O artigo 196 da Carta Magna determina que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”; ou seja, toda pessoa (não necessariamente brasileiro) em território nacional tem direito a ser atendido pelo SUS. Além disso, nossa Constituição também determina, no §1° do artigo 199, que “as instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde”. Logo, está claro que a saúde suplementar é um serviço adicional, que pode ser contratado pelo cidadão em caráter complementar ao serviço público e não substitutivo.
A lógica tributária da questão é ainda mais clara. O SUS é mantido por tributos pagos pelos cidadãos e empresas (inclusive as OPS). Ao contratar um plano de saúde, o beneficiário deste não deixa de pagar os tributos que financiam o SUS. Por que, então, perderia o direito de usufruir de um direito garantido na constituição? Ou, ainda que se alegue que o direito não foi perdido e que as OPS estão apenas reembolsando o Estado por um serviço que receberam para desempenhar, mas que foi desempenhado pelo poder público, não seria mais lógico, então, que o dinheiro retornasse para o beneficiário que já havia pago pelo serviço público?
A cobrança do ressarcimento, obviamente, não faz sentido. E pior, aumenta o custo dos planos de saúde para a população. Além disso, é fundamental entender que estamos falando de direitos e deveres constitucionais. Logo, são questões que não podem ser alteradas por Lei Ordinária, como é o caso da legislação sob análise.
Então, parece claro que a tese do ressarcimento deverá ser derrubada pelo STF, não é? Infelizmente, a questão não é tão simples. é fato que o ressarcimento, a nosso ver cobrado irregularmente, representa um volume considerável para os cofres públicos. Segundo dados da ANS, foram arrecadados dessa maneira cerca de R$ 1,2 bilhão entre 2000 e 2017 para o Fundo Nacional de Saúde (FNS). Uma cobrança irregular desse porte geraria uma dívida considerável para o Estado, sem mencionar todos os processos que poderiam surgir por conta da inscrição indevida de empresas na Dívida Ativa da ANS, além de um gigantesco acervo de execuções fiscais em curso.
O assunto, como se costuma dizer, “ainda tem muito pano para manga”. Nosso escritório vai continuar acompanhado de perto toda essa movimentação. Em caso de dúvida, converse conosco.