é de conhecimento geral que a mediação, arbitragem ou conciliação é uma prática comum no direito que consiste na busca de um entendimento entre as partes sem a necessidade de uma disputa judicial, evitando, muitas vezes um processo que tende a ser mais caro e moroso; mediação esta que tem como consequência um resultado de igual valor legal.
O processo de mediação é bastante simples: duas pessoas (físicas, jurídicas ou ambas) que, inicialmente, não estão de comum acordo sobre um tema elegem um indivíduo imparcial capacitado para determinar um desfecho justo, que deverá ser acatado pelas partes como se decisão judicial fosse.
O setor da saúde suplementar, como temos acompanhado, tem sido, cada vez mais, alvo da judicialização desenfreada. Não são poucos os pedidos de tutela judicial para procedimentos que, claramente, não deveriam ser objeto de tal interceptação por se tratarem de casos tipicamente eletivos.
Os inúmeros pedidos de autorização de cirurgia bariátrica compreendidos como sendo de urgência ou emergência são um ótimo exemplo da interferência do Judiciário que tende a determinar liminares para um caso de procedimento estritamente eletivo.
Isso porque, apesar de haver a necessidade de preenchimento de inúmeros conceitos técnicos e normas do Ministério da Saúde que determinam critérios e objetivos específicos para este procedimento, que, repita-se nunca poderá ser tecnicamente enquadrado como caso de urgência ou emergência, frequente acompanhamos juízes decretando a realização da cirurgia mediante tutela antecipada por receberem um laudo médico indicando suposto risco à vida do paciente.
Praticamente o laudo médico virou um título executivo!
Colocado o cenário da judicialização, e retomando o tema da mediação, tem-se que ano passado, a ANS reconheceu a utilidade do mecanismo de mediação nas hipóteses em que se verifica uma divergência médica entre o que foi requerido pelo médico que atende ao usuário do plano de saúde e a operadora de planos, tendo publicado a Resolução Normativa (RN) 424/17. Esta RN dispôs sobre a “realização de junta médica ou odontológica para dirimir divergência técnico-assistencial sobre procedimento ou evento em saúde”, determinando, inclusive, a possibilidade de haver consenso entre os participantes; ou seja, validando a mediação para a utilização na saúde suplementar.
O tema não é novo na saúde suplementar, no entanto, com a edição da RN 424/17 ganhou uma roupagem mais técnica e específica, permitindo melhor operacionalização e aplicação do conceito da mediação nessa esfera.
Apesar do enunciado desnecessariamente rebuscado e, talvez, confuso para quem não é do meio jurídico (como os milhões de beneficiários da saúde suplementar que poderiam se valer de termos mais claros nas normas da ANS), a RN 424/17, em vigor desde agosto de 2017, é bastante positiva. A regra determina que em caso de desacordo entre a Operadora de Planos e o médico quanto à necessidade de realização de um procedimento, poderá ser formada uma junta médica para equacionar a questão, sem a necessidade de uma ação legal.
Nosso escritório tem acompanhado de perto a questão e mesmo vendo a RN 424/17 como extremamente positiva, notamos que algumas dúvidas estão surgindo. Por isso, buscamos esclarecer, de forma bem sucinta, os principais tópicos abaixo.
Quando pode ser utilizada?
Em casos de desacordo entre OPS e profissional de saúde quanto à necessidade de um procedimento, desde que não seja um caso de urgência, emergência, procedimento não previstos no Rol da ANS ou em contrato e emprego de órteses, próteses e materiais especiais (OPMEs) não previstos no Rol da ANS ou aprovados pela Anvisa.
Pode haver a finalização do processo sem a autorização do pedido original e sem a constituição da Junta Médica?
Sim, desde que haja, comprovadamente, o consenso entre a operado e o profissional solicitante antes da realização da Junta e desde que seguidos os prazos de atendimento previstos na RN 259/2011.
Quem pode atuar como “desempatador” do desacordo entre o profissional da saúde e a OPS?
Essa figura pode ser preenchida por um profissional médico ou cirurgião-dentista devidamente habilitado para tratar o caso em questão ou o conselho profissional da categoria. Por exemplo, um cardiologista não poderia ser chamado para decidir sobre a necessidade de substituição de uma prótese no joelho.
Contudo, caso haja consenso entre as partes, é possível chamar um profissional de área diferente para mediar a “disputa”, inclusive cirurgiões dentistas para juntas médicas e médicos para juntas odontológicas, desde que pertinente no caso em questão.
A presença do paciente é obrigatória para a realização da junta?
Não, é possível que seja realizada a junta não presencial, no entanto, a presença do paciente pode vir a ser exigida pelo “desempatador”.
Os prazos para a autorização e realização do procedimento são suspensos enquanto a junta não chega a uma decisão?
Não. Os prazos para procedimentos ainda devem respeitar os prazos de garantia de atendimento definidos pela RN 259/2011.
Mas atenção, há dois casos de exceção à regra: o prazo pode ser estendido em até três dias úteis caso o “desempatador” entenda que são necessários exames complementares para balizar sua decisão; e, caso o paciente justifique sua falta a uma junta presencial em que sua presença foi solicitada pelo “desempatador”.
De qualquer modo, a extensão do prazo só pode acontecer uma vez.
Essas, nos parecem, são as principais dúvidas quanto à RN 424/17. Mas não as únicas, até porque trata-se de operação relativamente complexa e que requer organização e disciplina para a sua condução dentro dos prazos regulatórios previstos pela ANS, considerando todos os participantes do processo.
Assim, em caso de dúvida, fale conosco. Estamos preparados para ajudar.