MEDIDAS DE REABERTURA DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS E EFEITOS NO JUDICIÁRIO. COMO ESTÃO CORRENDO OS PRAZOS PROCESSUAIS E QUAIS AS NOVAS DINÂMICAS PARA OS PROCESSOS JUDICIAIS?

por Talita Portilho e Rodrigo Montenegro

Em março de 2020 a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou o surto da pandemia de COVID-19, acarretando imensurável impacto mundial em diversos aspectos: sanitário, socioeconômico, político, educacional e cultural.

No Brasil, os profundos efeitos negativos causados por este evento pandêmico sem precedentes têm revelado um enorme desafio aos Três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – formadores da estrutura político-administrativa.

O presente artigo pretende fazer uma abordagem voltada para as medidas judiciais adotadas no período estabelecido de isolamento social que ensejaram uma nova dinâmica para a condução dos processos judiciais, visando a entrega da efetiva prestação jurisdicional neste momento excepcional de crise.

Assim que foi estabelecida a necessidade de isolamento social para minimizar a propagação do contágio pelo coronavírus, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ editou a Resolução nº 313, de 19 de março de 2020, estabelecendo, no âmbito do Poder Judiciário, um regime de Plantão Extraordinário para uniformizar o funcionamento do serviço forense, salvaguardando o direito constitucional de acesso à justiça. 

Nos termos desta Resolução, todos os Tribunais, salvo o Supremo Tribunal Federal e a Justiça Eleitoral, tiveram decretada a suspensão presencial dos trabalhos e do atendimento ao público, sendo, contudo, mantido virtualmente o referido atendimento pelos meios tecnológicos disponíveis para cada unidade judiciária, visando assegurar a manutenção dos serviços essenciais, definidos por cada Tribunal.

Foi ainda determinada a suspensão dos prazos judiciais dos processos físicos e eletrônicos, a partir da sua publicação até o dia 30 de abril de 2020.

Diante das incertezas quanto ao fim da quarentena e consequente normalização das atividades jurisdicionais de forma presencial, o CNJ instituiu, por meio da Portaria nº 61, de 31 de março de 2020, a Plataforma Emergencial de Videoconferência para a realização de audiências e sessões de julgamento nos órgãos do Poder Judiciário, no período de isolamento social, facultando-lhes o uso da referida ferramenta e autorizando a utilização de outros meios tecnológicos ao alcance da mesma finalidade. 

Todavia, considerando o crescimento exponencial no número de infectados pelo coronavírus em todo o país, foi necessária a prorrogação das medidas impostas na Resolução CNJ nº 313/2020, principalmente quanto à suspensão da atividade forense presencial, bem como dos prazos dos processos físicos, ficando, no entanto, determinada a retomada da fluência dos prazos dos processos eletrônicos a partir de 04/05/2020.

Posteriormente, com supedâneo em decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, em sessão realizada aos dias 06/05/2020, em que se atribuiu aos Estados e Municípios a competência para adoção das medidas de restrição à locomoção intermunicipal e local durante o estado emergencial decorrente da pandemia do COVID-19, e posterior flexibilização das regras de isolamento social por certos Entes Federativos, o CNJ editou a Resolução nº 322, de 1º de junho de 2020, que dispôs sobre as regras mínimas necessárias, no âmbito do Poder Judiciário, para a retomada gradual e sistematizada, a partir de 15/06/2020, dos serviços jurisdicionais presenciais nos Tribunais, onde houvesse esta possibilidade.

Pela leitura do novel normativo, depreende-se que cada Tribunal analisará se atende às condições sanitárias exigidas para retomada do serviço forense em suas unidades jurisdicionais e administrativas, tomando por base o estágio de disseminação da COVID-19 na área de sua competência.

Sendo possível o retorno gradual, deverão os Tribunais definir as medidas de biossegurança, em consonância com aquelas fixadas pelo CNJ, promovendo as adaptações para evitar o contágio do coronavírus.

Vale destacar que os Tribunais de Justiça do Rio de Janeiro e de São Paulo já apresentaram seus respectivos planos de retorno gradual às atividades presenciais, nos seguintes termos:

A Corte Fluminense estabeleceu 4 etapas progressivas, sendo a primeira iniciada em 29/06/2020, com retorno restrito dos servidores; a segunda iniciada em 13/07/2020, para atendimento somente dos profissionais do meio jurídico; a terceira, iniciada em 27/07/2020, com o retorno da fluência dos prazos físicos e atendimento ao público em geral; e a quarta e última etapa, apenas será estabelecida com o fim declarado da pandemia ou decisão do Presidente desta Corte, com a normalização integral.

O Tribunal Paulista estabeleceu um plano inicial e progressivo, sendo a primeira etapa prevista para 27/07/2020, com retorno restrito dos servidores, profissionais do meio jurídico, agentes de segurança, profissionais da imprensa, partes e testemunhas para atos pré-determinados; a segunda etapa, iniciada em 03/08/2020, previu o retorno da fluência dos prazos dos processos físicos e atendimento ao público, somente nos casos expressos no Provimento.

Passados mais de quatro meses do início da quarentena e das medidas extraordinárias firmadas pelo Poder Judiciário para preservação do acesso à justiça, pode-se concluir que todos os recursos tecnológicos foram determinantes para a manutenção da prestação jurisdicional, ainda que parcial, evitando-se a descontinuidade desse serviço essencial neste cenário de calamidade pública.

Durante a pandemia enfrentada no Brasil, diversas práticas inovadoras foram implementadas ou ampliadas pelo Poder Judiciário, como o trabalho em regime de home office dos magistrados e demais serventuários, a realização virtual de audiências e sessões de julgamento, os despachos tele presenciais com os advogados, além da ampliação da digitalização dos processos físicos.

Mutatis mutandis, o distanciamento físico entre os operadores do direito, provocado pelo isolamento social acabou sendo praticamente neutralizado pelas ferramentas virtuais colocadas em prática pelo Poder Judiciário, que garantiu não só a continuidade do essencial acesso à Justiça, como também a duração razoável dos processos eletrônicos.

A possibilidade de audiências e sessões de julgamento por meios tecnológicos com a eliminação do deslocamento de partes, advogados, serventuários e magistrados, bem como a realização de despachos intermunicipais e interestaduais entre advogados e magistrados, por meios digitais, foram importantíssimos benefícios conquistados pela sociedade, que se refletem na real otimização do tempo e na inegável redução de gastos de todos os envolvidos.

A toda evidência, muitos paradigmas e preconceitos foram quebrados, e novos costumes implementados, o que reforça a ideia de que muitas dessas diretrizes adotadas pelo Poder Judiciário tornar-se-ão permanentes após o fim da pandemia, trazendo, neste enfoque, um legado muito positivo.

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